Em um momento histórico de transformação econômica e social, o Brasil e a América Latina se encontram diante de uma oportunidade única: utilizar a inovação financeira para promover a inclusão e reduzir desigualdades. Com a adoção acelerada de novas plataformas digitais, torna-se possível conectar populações historicamente excluídas a serviços antes inacessíveis. Este artigo explora como as fintechs de impacto estão redesenhando o setor, os desafios que enfrentam e as perspectivas que já apontam para um futuro mais justo.
Apesar de avanços expressivos, o país ainda convive com 45 milhões de desbancarizados, representando quase 29% da população adulta sem acesso pleno a produtos bancários. Esse cenário limita a capacidade de investimento, consumo e proteção financeira de famílias inteiras. A desbancarização acarreta não apenas barreiras de serviço, mas também reforça ciclos de pobreza e informalidade. É nesse contexto que soluções inovadoras se tornam essenciais para garantir desenvolvimento sustentável.
O Brasil se consolidou como o maior hub fintech da região, com mais de 1.700 iniciativas ativas em 2025, o que equivale a 58,7% de todas as fintechs latino-americanas. Dessas, 10% são reconhecidas como fintechs de impacto social, focando em atender quem está à margem do sistema tradicional. Por meio de tecnologias modernas, essas startups oferecem crédito justo, meios de pagamento simples e educação financeira personalizada.
Empresas como o Banco Maré, Celcoin e Noverde ilustram esse movimento. Cada caso evidencia a força de modelos que unem rentabilidade e propósito social, mostrando que é possível escalar soluções com impacto real.
Os desbancarizados estão concentrados majoritariamente no interior do país (62%) e no Nordeste (39%), regiões que demandam infraestruturas e estratégias específicas. A presença maciça de pequenas cidades, muitas vezes sem cobertura de internet de alta qualidade, exige adaptações nos produtos e no modelo de distribuição.
Para superar essas barreiras, as fintechs de impacto investem em parcerias locais, uso de tecnologia offline-first e treinamento de agentes comunitários, promovendo uma abordagem híbrida que combina presença física e digital.
O orçamento global dos bancos brasileiros para tecnologia deve chegar a R$ 47,8 bilhões em 2025, com IA, analytics e big data ocupando 61% desse investimento. Enquanto isso, a revolução do Pix consolidou-se como um dos maiores marcos: em 2024, foram realizadas 208,2 bilhões de transações, e o Pix Automático promete facilitar pagamentos recorrentes para cerca de 60 milhões de pessoas sem cartão de crédito.
Além disso, a ascensão dos bancos digitais — como Nubank, Inter e C6 Bank — pressão o mercado a inovar constantemente e repensar estruturas. A convergência entre open banking, APIs abertas e blockchain abre espaço para tecnologia de blockchain para criar moeda digital e estabelecer sistemas de pagamentos mais seguros e transparentes.
O Banco Maré exemplifica como a inovação pode transformar realidades: com a criação da moeda digital Palafita, gerida por meio de aplicativo, já transaciona mais de R$ 2 milhões por mês e obteve uma redução de 65% no número de contas atrasadas nas comunidades atendidas. Esses resultados foram possíveis graças a um modelo que alia tecnologia, governança local e educação financeira.
A Celcoin, por sua vez, converteu celulares em pontos de atendimento bancário em mais de 2.000 cidades, construindo uma rede de 20 mil agentes locais. Com isso, movimentando R$ 1 bilhão em um ano, impactou diretamente a renda de famílias que, em média, viram seus ganhos aumentar em até 20%.
O Noverde, especializado em crédito online com avaliação de risco por dados alternativos, utiliza aprendizado de máquina para democratizar o acesso a empréstimos. Ao considerar variáveis não tradicionais, ampliou os critérios de concessão, atendendo sobretudo classes C e D.
O horizonte promete ainda mais transformações, com a expansão internacional das fintechs brasileiras e o fortalecimento de ecossistemas colaborativos. A adoção de IA generativa, a proliferação de soluções DeFi e a incorporação de ativos digitais poderão criar novos modelos de acesso a crédito, poupança e investimento.
Essas tendências indicam que o campo permanece como um “oceano azul”, pronto para iniciativas que mesclem propósito e tecnologia de ponta.
Organizações financeiras, fintechs e governos podem atuar de forma coordenada para maximizar resultados. Primeiramente, é crucial estabelecer parcerias público-privadas de longo prazo, que unam capital, conhecimento técnico e alcance territorial.
Investir em programas de educação financeira digital e presencial contribui para o uso consciente de serviços, reduz inadimplência e aumenta a fidelização do cliente.
Adotar métricas de impacto socioeconômico, além de indicadores financeiros, permite ajustar estratégias em tempo real e comprovar resultados a investidores e reguladores. A construção de dashboards que relatem número de usuários atendidos, volume transacionado e índice de satisfação fortalece a transparência.
Por fim, incentivar a criação de hubs regionais de inovação vai descentralizar o desenvolvimento de soluções, garantindo que produtos sejam pensados de acordo com as realidades locais, sejam elas urbanas ou rurais.
O futuro das finanças de impacto social já chegou, e a combinação de tecnologia, capital humano e propósito tem o poder de transformar milhões de vidas. Ao adotarmos uma visão integrada e colaborativa, podemos construir um sistema financeiro verdadeiramente inclusivo, onde cada indivíduo tenha acesso às ferramentas necessárias para crescer e prosperar. Chegou a hora de unir esforços, escalar soluções e materializar o potencial de um novo modelo econômico que coloca as pessoas em primeiro lugar.
Referências